Contos de Rodoviária: Maria


Estou aqui, mais uma vez, esperando o ônibus
Que vai me levar para onde eu mais quero.
Horas após horas eu espero,
Sem medo ou desespero.

Minhas pernas doem, elas já não são mais as mesmas,
Elas tem um aspecto cansado, revirado
O mesmo aspecto que tem meu rosto, enquanto me olho no espelho
E tento encontrar, num par de olhos que não dorme
Algum brilho que ainda viva, ou que ao menos retorne.

O sol brilha lá fora em meio a um céu azul,
Tão azulado quanto os olhos do filho que estou indo ver.
O tempo que não passa agora enquanto aguardo
É o mesmo tempo que nos separou até agora.
Olho pro chão, e consigo perceber
Que o tempo é um fardo ,
E que carregá-lo já fora mais difícil, mas hoje é sinônimo de viver.

E quando eu vê-lo, filho
Só desejo que o coração não doa tanto quanto ficar de joelhos.
Pois o primeiro abraço após a separação dói mais do que nunca mais se encontrar.
Mas lembro que todo encontro só acontece quando algo se perde
E quando algo se perde, o comum é voltar,
Procurar,
Reviver o passado pra adivinhar
Onde aquilo se perdeu.
E este sempre foi um erro meu, tentar acertar
Consertar meros enganos
Enquanto o relógio andava sem me esperar.

Os devaneios param quando meu transporte chega,
Trazendo no bagageiro o brilho dos meus olhos,
Como se eles tivessem ido embora pra viajar.
O espelho já não é mais necessário, pois sei, e sinto, que estou sorrindo
Cansaço é agora uma palavra fora do meu dicionário
E parece que posso correr uma maratona, pelo calor que inebria minhas pernas.

Sem medo, ou desespero,
Horas após horas eu esperei,
Pelo ônibus que vai me levar para onde mais quero.
A roupa do motorista é azul, assim como o céu, assim como os olhos do meu filho
Que há anos, morreu.
Mas vou reencontrá-lo,
Pois eu também estou, agora.

Aún que pueda caminar
correr y volar
No me muevo
Viene, y me lleva lejos
En tus brazos no hay miedo
O indecisión.